sexta-feira, 22 de março de 2013

Anánke


Aquele que diz que tudo acontece por necessidade não tem nada a reprovar àquele que diz que tudo não acontece por necessidade, porque diz que isso mesmo acontece por necessidade.(SV, 40)

O argumento da necessidade é assim criticado por ser auto-refutável, pois quem o sustenta não tem mérito por isso, embora pense ter e, por sua vez, quem o rejeita não pode ser reprovado por rejeitá-lo, uma vez que tudo acontece por necessidade. Ou seja, o próprio físico da necessidade admite haver uma liberdade no nosso ato de pensar e dialogar, pois, de fato, crê que a correção do seu argumento e a falha do argumento de seu interlocutor vêm deles mesmos.
Deste modo, a negação da necessidade na origem (cf. DL, X, 90, onde se nega que o nascimento de um mundo seja possível por "necessidade mecânica") e, portanto, sua limitação, quebra os elos da corrente causal que determinariam até mesmo nossos pensamentos e ações, privando-nos assim, da liberdade. Tal quebra abre espaço para a ação livre, porém não é constitutiva dela, pois a negação da necessidade dá vazão ao seu oposto, a saber, o acaso (týche), entretanto este não propicia a liberdade, pois ele é inconstante (ástaton), apenas dá condições para, uma vez ausente a necessidade, agirmos livremente. Lembremo-nos aqui, que existem três modos de ocorrência na phýsis: necessidade, acaso e por nós (par'hemás) (D.L. X, 133). Assim, com a necessidade restrita o acaso garante seu lugar na phýsis, abrindo a possibilidade para a ação livre. Porém essa possibilidade só se efetiva quando entra em cena o logísmos e a autárkeia (o cálculo racional e a autossuficiência). 

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